RESPIRAÇÃO E COMPORTAMENTO

“Uma vela acesa respira e o resultado é a chama. O corpo respira e o resultado é a vida. Nem a chama nem a vida são substâncias, mas processos. A chama é tão diferente do pavio e da cera quanto a vida, do corpo, a gravidade, da maçã em queda ou o amor, dos hormônios.” John W. Severinghaus (1922-2021) Respirar é um verbo, então nos remete a ação. Essa ação nos promove a vida, sem respirar não vivemos. É o primeiro e também o último ato que realizamos nessa nossa existência nessa tridimensionalidade. De tamanha importância essa ação, ela nos perpassa os dias, sem sequer nos percebermos de que maneira a fazemos: como agimos na respiração? Esse pequeno texto inicial de John W. Severinghaus já nos coloca nesse ponto da observação. Médico e Físico que inventou a moderna análise de gases sanguíneos, uniu a ciência da respiração à arte da medicina. Ele foi o inventor, que trouxe benefícios às pessoas através do seu amplo conhecimento médico e físico, do analisador de gases sanguíneos (oxímetro). Passou a vida a estudar a respiração, do ponto de vista do equilíbrio eletrolítico (ácido básico) e agradecemos suas incríveis descobertas. Mas voltando ao ato de respirar, o processo respiratório, tudo que envolve essa ação que nos passa pela vida sem que nos atentemos a seus detalhes (exceto os que lidam com ela e seus significados diariamente). Assim com a respiração, vem junto a circulação sanguínea, o sistema cardiorrespiratório que desde a vida embrionária vem formar o coração e o pulso da vida. O controle da respiração pelos centros respiratórios bulbares, por meio de “leituras” bioquímicas (o famoso pH) nos fornece informações autônomas e neurovegetativas (nervo frênico) que vão para nossos músculos respiratórios. A respiração é o principal mecanismo de controle do pH do sangue. MAS SABEMOS QUE ESTADOS DE ANSIEDADE E ANGÚSTIA TAMBÉM ALTERAM A RESPIRAÇÃO. Temos então esse comando central, cerebral da respiração. A respiração lenta e profunda aumenta a taxa de endorfinas (hormônios do bom humor), podendo agir de forma benéfica nos estados de tensão e estresse. Você pode estar me perguntando sobre o tema desse Caderno: mas como a respiração tem relação com o comportamento? Como a respiração pode ser agente de mudança? Então vamos lá: como você está respirando nesse momento? Pare o que está fazendo e preste a atenção a sua respiração: a frequência, volumes, temperatura, sensações. Quando “paramos” para perceber como estamos respirando já alteramos nosso comportamento, nosso tônus, nossas percepções e emoções. Durante um minuto, respiramos cerca de 5 a 8 litros de ar, mesmo em repouso, e além do controle neurológico, também dependemos do nosso tecido pulmonar, da elasticidade do pulmão, de líquidos que se movimentam, de superfícies que deslizam entre si. A complexidade do movimento respiratório é tamanha, que dela dependemos. Bom, voltando a relação desta com o comportamento, se tal complexidade envolve diferentes tecidos e controles, podemos entender que alterações químicas, neurológicas, eletrolíticas, mecânicas (incluindo as musculares aqui) e hormonais podem alterar essa função. Sobre nosso comportamento também podemos relacionar toda essa complexidade, mas aqui temos um componente importante: a cognição, a memória, nosso consciente e inconsciente. Podemos relacionar à respiração a fala, nossa voz, então a respiração e a comunicação estão de mãos dadas na nossa vida, já dizia Wilheim Reich quando estudou e nos apresentou as couraças musculares do caráter. Da Psicanálise, onde se pauta na fala e na palavra, na conversa, tendo Freud como seu precursor, onde não se considerava uma análise mais corporal, tônica, da expressão do nosso eu. Mas com os estudos e práticas de Reich, Lowen e demais autores, dentre esses nosso maior representante José ngelo Gaiarsa, a respiração foi “readmitida” no espaço da psicologia e da consciência. Aqui deixo uma frase deste, no livro, “Respiração, angústia e renascimento” da editora Àgora: “…todas as emoções do aqui e agora estão essencial e profundamente ligadas ao aparelho cardiorrespiratório” Através das análises da respiração e das atitudes corporais “entendemos” comportamentos e são tratados distúrbios comportamentais e sofrimentos psicossomáticos de diversas ordens. Dizia Reich: “Qualquer ativação da couraça muscular do caráter envolve sempre uma inibição respiratória.” Nota-se ai a importância do comportamento da respiração com as atitudes e emoções das pessoas. “Apertar o peito” não é uma metáfora; quer dizer endurecer o tórax, ou apertar o peito com as mãos ou com outro gesto, conforme o que parece melhor no momento. Mas é um esforço corporal, muscular; não é apenas mental. Para entrar mais nesses assuntos, sugiro ler obras de Freud, Reich e Jung, assim como as de José ngelo Gaiarsa. Aproveito para convidar a assistirem o Podcast Fala Inner que irá ao ar junto com esse Caderno Corporal. Conversaremos com o sobrinho neto de J.A.Gaiarsa, Arthur Gaiarsa, que vem trazendo luz aos livros e materiais do psicanalista brasileiro, unindo com seus conhecimentos e práticas da Bioenergética entre outros. Espero você no nosso Fala Inner. “A individualidade começa no coração e completa-se na respiração, motivos a mais, e tão importantes, para se dar a estas funções um valor psicológico que lhes tem sido negado até o presente.” (J.A. Gaiarsa no livro: “Respiração e Circulação” 1990-editora agora. Abraço de coração com respiração Monica Kestener

INNER SENSE

Ser Dia e Ser Noite – Corporificando a experiência

Escrito por Constância Matos “O corpo ocupa o coração de nosso processo de investigação.” (Danis Bois) Viver e ser vivido, corporificar a experiência e expressar-se a si mesmo. Organizar-se no mundo a partir de um ritmo próprio; um ritmo que possibilite o entendimento do que se é, de onde está e onde se quer chegar. Esta edição do caderno Corporal é um convite para pensarmos o papel do corpo e a sua relação com as nossas experiências e a aprendizagem, sob a luz dos estudos somáticos de Stanley keleman. Em, “O Corpo diz sua mente”, seu primeiro livro conceitual, Keleman parte de dois eventos bem marcados em um dia comum do indivíduo para falar sobre experiência: O “levantar-se pela manhã”, e “dormir à noite”. Ele chama de “processo de organização” o modo como nós nos estruturamos somaticamente para “ser dia”, “estar de pé”, “vestir-se da excitação”, excitação que propulsiona o aprender, compartilhar e realizar coisas; e como ser noite, pausar, dar-se o descanso, se colocar na horizontal para que o corpo assimile todas as informações do dia vivido. A nossa verticalidade dá início ao processo que conhecemos como consciência humana, humanidade..[…] Ficamos de pé e aumentamos o nosso envolvimento. Quando ficamos sobre os nossos pés, focamos e exprimimos a nós mesmos. Ficar de pé muda a nossa ênfase da experiência à expressão. A experiência quando está presente na expressão, não requer foco ou risco. A experiência nos preenche e expande. (keleman, 1996, p16). Este padrão rítmico (acordar e dormir), organiza o indivíduo no mundo como um corpo sensível/formativo, que corrobora para que cada ser viva em um ajuste contínuo, a fim de interagir com o outro, com o ambiente e também para ser ele mesmo. Um corpo em um contínuo processo formativo, um corpo vivo que estabelece relações e que se molda a partir da consciência. Reconheço-me como corpo no mundo, “existo” a partir da minha história de vida pessoal, história que forma os meus gestos, e a minha expressão corporal, através da qual afirmo a minha existência. Estamos o tempo todo buscando preencher e ser preenchidos, o levantar-se da cama e sair para realizar as diversas tarefas de um dia oportuniza a minha conexão com o que está fora de mim e com o que está dentro, a clareza destes dois lugares oportunizados pela experiência me dá condições de re-padronizar o comportamento e também de adquirir novas aprendizagens. Keleman chama nossa atenção para um lugar muito importante no processo da autoformação e da aprendizagem: o reconhecimento da dimensão do tempo. De acordo com Keleman os conflitos de aprendizagem surgem quando não reconhecemos o nosso tempo de aprendizagem, quando impomos a velocidade de outra pessoa à nossa velocidade e quando não consigo construir somaticamente o tempo (não permitir que as coisas finalizem), não há permissão de se passar de uma coisa para outra. Quando nos sensibilizamos para o tempo que alguém leva para fazer alguma coisa então podemos mudar a maneira pela qual nos relacionamos. Podemos criar um tempo compartilhado, retirar-nos para nosso próprio tempo e, quando necessário, atuar sobre o tempo de outras pessoas. (Keleman, 1994, p.44) Uma vez estabelecida a noção do tempo para as coisas, permitimos que a experiência aconteça por si mesma, saímos da posição daquele que inspeciona, do que julga e critica. Ao deixarmos esse lugar de observadores/julgadores de processos, entramos no lugar disponível para a aprendizagem, o lugar da empatia, da sensibilidade ao tempo de cada um. Esse é o lugar que a abordagem somática do Inner Balance quer trazer para nós instrutores/facilitadores do movimento e para nossos alunos/aprendizes. Um lugar onde um ser é afetado pelo outro. Um lugar não hierárquico, um lugar sensível ao ritmo da corporificação da aprendizagem, reorganizando a nós mesmos e aquilo que nos cerca. Um lugar onde juntos aprendemos a “ser dia” e a “ser noite”. Bibliografia consultada KELEMAN Stanley. Realidade Somática. Experiência corporal e verdade emocional. Summus editorial, Brasil 1994 _ O corpo diz sua mente. 2a ed. Summus editorial, Brasil 1996 _ Corporificando a experiência. Construindo uma vida pessoal. 3ª edição. Summus editorial, Brasil.

INNER SENSE

“Respirar bem é uma escuta do corpo. É parar e pensar como estamos no mundo”

“Respirar bem é uma escuta do corpo. É parar e pensar como estamos no mundo”.   Bruna Petito Você costuma escutar o seu corpo, por exemplo: parar e perceber a sua respiração? Como ela está, no instante em que você lê este texto? Enquanto aqui nesta leitura, te convido a ler o livro do seu corpo, leitura que requer tempo, sensibilidade e atenção. No começo essa percepção pode parecer distante, tranquilize-se: a prática leva-nos ao aprendizado e logo a experimentar o quão maravilhosa é a autonomia que a escuta corporal promove para o nosso “estar no mundo”. A respiração é importante para um corpo harmonioso e se você é uma pessoa que se preocupa muito com a postura, saiba que a respiração tem influência direta sobre a maneira que nosso corpo, esta arquitetura divinamente projetada se equilibra sobre a gravidade. O nosso sistema orgânico agradece o respirar bem, porque o respirar bem nos devolve a plenitude, nos restitui a consciência  de nós mesmos, uma boa oxigenação promove a saúde das células presentes em cada um dos tecidos que compõem o nosso corpo. Seria como se a água de um rio fluísse na direção correta levando os detritos para longe, possibilitando uma desintoxicação do nosso corpo e da mente. Ao contrário do respirar bem, respirar superficialmente corrobora para que percamos nossas percepções e sensações, levando-nos a automatismos desde a nossa relação com o próprio corpo, com os outros e com o espaço. Os órgãos aos poucos perdem a sua vitalidade tornando-se mais lentos, contribuindo para a fragilidade e posteriormente ao adoecimento do corpo. Para muitos de nós respirar bem significa encher os pulmões de ar. E quanto à expulsão deste ar? Temos permitido que o ar entre e saia optimamente dos pulmões? Onde apoio minha expiração? Dou uma pausa para minha expiração ter um suporte e só então encher novamente os meus pulmões, expandindo o campo relacional do interno e o externo? Percebo o que deixa a minha respiração entrecortada? Consigo perceber quando fatores emocionais interferem na minha respiração? O que tem impedido meu respirar de forma saudável? Percebo a conexão da respiração com meus movimentos? Você pode estar se perguntando, mas o que é respirar bem? Como posso respirar para desfrutar de todos os benefícios que uma boa respiração pode fazer pelo meu sistema? Como tudo que envolve o ser humano, a respiração também está no campo da subjetividade. Quando nos dispomos a uma atenção plena, o respirar bem vai acontecendo como deve ser, naturalmente. Encontramos o nosso ritmo respiratório mesmo que sejamos um tanto ansiosos. Podemos é claro  nos valer de técnicas que nos auxiliem a encontrar a respiração adequada para a saúde do nosso corpo, mas o importante é que encontremos o nosso próprio caminho, o nosso próprio ritmo, reconhecendo através da escuta, da leitura do corpo, o funcionamento harmonioso e orgânico da relação com meu corpo e o espaço que ele ocupa no mundo. Dicas: Deixe o ar entrar suavemente pelas narinas, encontre um suporte para que o ar saia novamente, coloque o corpo em escuta (uma pequena pausa), até que sinta a necessidade de inspirar novamente. Relação da respiração com os Sons ao redor Grounding Texto de Constância Matos